Fator de queda na montagem de torres em subestações

Neste Comentário abordaremos um trabalho em altura complexo, a montagem de torres em subestações. Neste cenário, além dos riscos e desafios pertinentes ao trabalho em altura, o fator que mais nos preocupa é… o fator de queda!

(imagem 01: Subestação da UTE Porto de Sergipe 1 – créditos foto João Saraiva)

Fator de queda: razão entre a distância que o trabalhador percorreria na queda e o comprimento do equipamento que irá detê-lo. (glossário da NR 35)

No processo construtivo das torres, como na montagem de andaimes, na verticalização da estrutura não existem pontos estruturais acima da posição do trabalhador que possam ser usados como pontos de ancoragem, ocorrem aí fatores de queda maiores que 1, igual a 2 e maior que 2. Lembrando que para calcularmos o fator de queda aplica-se a seguinte formula:

Fator de Queda = Q

Q = Altura da queda livre / comprimento do talabarte

(imagem 02: Exemplo de fator de queda maior que 1 – créditos foto João Saraiva)

   Nesta situação a ancoragem do trabalhador, ou seja, o ponto onde ele conectou o seu talabarte está abaixo do ponto de conexão do seu cinto, exemplificando melhor se seu talabarte possuir 1,5 metros e o tamanho desta diferença for de 0,3 metros aplicando a formula de cálculo teremos:

Tamanho da queda livre: 1,5 metros do talabarte (esta será a distância percorrida pelo trabalhador até haver a retenção de sua queda pelo equipamento) + 0,3 metros (diferença existente entre o ponto de ancoragem do talabarte e o ponto de conexão do cinto) = 1,8 metros.

Tamanho do talabarte: 1,5 metros

Assim: 1,8/1,5 = 1,2

(imagem 03: Exemplo de fator de queda 2 – créditos foto João Saraiva)

   Neste cenário o trabalhador ancorou seu talabarte junto aos pés, assim o cálculo para seu fator de queda será:

Tamanho da queda livre: 1,5 metros do talabarte (esta será a distância percorrida pelo trabalhador até haver a retenção de sua queda pelo equipamento) + 1,5 metros (diferença existente entre o ponto de ancoragem do talabarte e o ponto de conexão do cinto) = 3 metros.

Tamanho do talabarte: 1,5 metros

Assim: 3/1,5 = 2

(imagem 04: Exemplo de fator de queda maior que 2 – créditos foto João Saraiva)

   A imagem acima mostra uma situação extremamente perigosa para o trabalhador exposto, o fator de queda maior que 2, caso haja a queda do trabalhador, sua ancoragem que já se encontra posicionado ao nível de seus pés, necessitará correr pela estrutura até que a mesma encontre um ponto de parada e execute a retenção da queda do trabalhador. Aplicando a formula:

Tamanho da queda livre: 1,5 metros do talabarte (esta será a distância percorrida pelo trabalhador até haver a retenção de sua queda pelo equipamento) + 1,5 metros (diferença existente entre o ponto de ancoragem do talabarte e o ponto de conexão do cinto) + 1,0 metros (espaço existente entre o ponto de conexão do talabarte na estrutura “A” e o ponto onde haverá seu bloqueio “B”) = 4 metros.

Tamanho do talabarte: 1,5 metros

Assim: 4/1,5 = 2,7

Lembrando que todos os fabricantes de equipamentos de retenção de quedas advertem sobre os riscos de queda nas condições de fator de queda 2, tal preocupação se baseia na energia gerada pela queda do trabalhador que pode comprometer a integridade dos equipamentos, da ancoragem e do próprio corpo do trabalhador.

(imagem 05: Manual de equipamento ressaltando o perigo do fator de queda 2 – créditos imagem TASK)

(imagem 06: Manual de equipamento ressaltando o perigo do fator de queda 2 – créditos imagem Hercules)

   É do fator de queda que vem uma importantíssima variante que aplicamos no calculo da energia potencial gravitacional, energia esta que irá atuar no corpo do trabalhador, em seu sistema de proteção contra quedas individual (SPCQI) e na ancoragem. Para melhor entendimento do assunto iremos conhecer melhor como calcular esta energia:

Energia Potencial Gravitacional

   Todo corpo em queda livre está sujeito a uma mesma aceleração de direção vertical e sentido para baixo. Esta aceleração recebe o nome de aceleração gravitacional (g) que tem um valor aproximado de 9,8 m/sna Terra. A força resultante neste movimento é a força peso (P=m.g) e o trabalho desta força é igual a energia potencial gravitacional. Logo, quando um corpo é liberado, a força peso realiza trabalho e a energia potencial gravitacional se transforma em energia cinética.

A energia potencial gravitacional de um corpo que se encontra a uma altura (h) do solo é dada por:

Epg = m . g . h

Onde:

  • Epg = energia potencial gravitacional (em joules)
  • m = massa – dada em quilograma (kg)
  • g = aceleração gravitacional – dada em metros por segundo ao quadrado (m/s2)
  • h = altura – dada em metros (m)

Baseados nesta formula calcularemos a energia gerada numa eventual queda, tendo como cenários os identificados nas fotos mostradas anteriormente, para a massa dos trabalhadores usaremos a média de 75 kilos por individuo:

Cenário Dados Calculo da EPG Resultado Impacto gerado no trabalhador
 foto 02 Fator de queda: 1,2

Distância da queda: 1,8 metros

Epg = 75*9,8*1,8 1.323 Joules  

   134,91 Kg

 foto 03 Fator de queda: 2

Distância da queda: 3 metros

Epg = 75*9,8*2 1.470 joules  

   149,9 Kg

 foto 04 Fator de queda: 2,7

Distância da queda: 4 metros

Epg = 75*9,8*4 2.940 Joules  

299,80 Kg

Percebemos assim que as quedas, quando ocorrem, elevam a massa dos trabalhadores de maneira espantosa e que coloca os indivíduos em risco muitas vezes, de morte. Estudos indicam que o corpo humano pode suportar no máximo 12Kn (1200 Kg) de impacto sem o risco de graves lesões ou de morte, assim, percebemos que ao expor ou permitir que os trabalhadores trabalhem em condições de fatores de queda muito altos, estamos assumindo riscos altíssimos, mesmo estando os trabalhadores utilizando equipamentos com absorvedor de energia que dissiparão esta força de impacto, mas também nos preocupando com a resistência real dos pontos de ancoragem escolhidos. Para trazermos estas situações a níveis aceitáveis o caminho a seguir é investir em treinamento de qualidade, selecionar os equipamentos mais adequados ao cenário de trabalho, monitorar os fatores de queda das atividades, diminuir o tempo de exposição e a quantidade de trabalhadores envolvidos em fatores de queda altos inevitáveis, promover a constante atualização de procedimentos de trabalho com métodos e técnicas mais seguras, inspecionar rigorosamente os equipamentos para proteção contra quedas , além de rigorosa fiscalização para garantir o cumprimento e a aderência dos trabalhadores as normas de segurança.

Como regra básica da equipe de gestão de trabalhos em altura, em especial o de montagem de torres por sua complexidade fica a citação da marca francesa PETZL “a lei da gravidade é cumprida rigorosamente e, quando você toma o lado errado desta lei, a punição é negociada em força de impacto”.

Trabalhe seguro!

Sobre o autor: JOÃO MARCELO RIBEIRO SARAIVA é Profissional em Acesso por cordas (alpinismo Industrial) com Certificação ABENDI, Especialista em resgate vertical avançado, Especialista internacional em sistemas de ancoragens, Supervisor de trabalho em altura N2 pelo sistema Task College, Técnico em Segurança do Trabalho com experiência em projetos onshore e offshore, Bombeiro industrial civil, Instrutor de treinamentos de NR 35 e NR 33, Instrutor de Resgate vertical e Montanhista esportivo a mais de 20 anos. É desenvolvedor do sistema Horus de gerenciamento de NR 35, Consultor técnico da Horus Soluções Verticais, criador do nó Borboleta Sergipana com 3 e 4 alças e de outros sistemas para atividades verticais.

 

 

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